Por Paulo Jardel Faiad

 

De frente para a praia, o sol aquece a sua pele, uma brisa suave e cheia de oxigênio acaricia seu rosto e invade seus pulmões; no horizonte um mar turquesa sem fim; no céu, aves marinhas flutuam ao sabor dos ventos. A água e a espuma tocam seus pés, o som das ondas e o cheiro da maresia expande os sentidos, todos assim, em festa. Algo incompreensível te traz uma paz imensa, como um reflexo, você inspira o ar profundamente.

Basta lermos o parágrafo acima para nos transportarmos novamente a estes momentos inigualáveis de contato com a natureza. Trazemos as lembranças daqueles momentos em que estávamos tristes e ela nos abraçou como uma mãe; que estávamos cansados mentalmente e ela nos repôs as energias.

Falar em energia vinda da natureza que recarrega nossas baterias, para alguns ainda parecerá algo muito abstrato ou até mesmo esotérico…. Mas é possível sair da mesma forma que entramos em um banho de cachoeira? Há, sem dúvida, algo nestes nossos encontros com o natural que nos alimenta, nos renova e nos reconecta.

Jesus, nosso governador planetário, exemplificou em diversas passagens do Evangelho, que os ambientes naturais eram os melhores palcos para compartilhar seus ensinamentos e discursos. Esses locais inspiravam reflexão, contemplação e conexão com o divino.

A grandiosidade da natureza nos ajuda a ajustar o ponto de vista pelo qual observamos a vida terrena. O capítulo 2 do Evangelho Segundo o Espiritismo nos apresenta a analogia de subir ao monte, para de lá, ajustar nosso olhar sobre como são pequenas as coisas que, no turbilhão das rotinas urbanas, nos parecem tão grandes. Vejamos:

 

“Colocando o ponto de vista, de onde considera a vida corpórea, no lugar mesmo em que ele aí se encontra, vastas proporções assume tudo o que o rodeia. O mal que o atinja, como o bem que toque aos outros, grande importância adquire aos seus olhos. Àquele que se acha no interior de uma cidade, tudo lhe parece grande: assim os homens que ocupem as altas posições, como os monumentos. Suba ele, porém, a uma montanha, e logo bem pequenos lhe parecerão homens e coisas. É o que sucede ao que encara a vida terrestre do ponto de vista da vida futura; a humanidade, tanto quanto as estrelas do firmamento, perde-se na imensidade. Percebe então que grandes e pequenos estão confundidos, como formigas sobre um montículo de terra; que proletários e potentados são da mesma estatura, e lamenta que essas criaturas efêmeras a tantas canseiras se entreguem para conquistar um lugar que tão pouco as elevará e que por tão pouco tempo conservarão. Daí se segue que a importância dada aos bens terrenos está sempre em razão inversa da fé na vida futura.”

 

Dentre as passagens bíblicas de Jesus na natureza, temos o maior exemplo delas – o Sermão da Montanha, registrado em Mateus 5-7. Relata que Jesus subiu a um monte e, diante de uma multidão, ensinou sobre o reino de Deus e as bem-aventuranças. A escolha desse local não foi casual. O monte oferecia uma visão panorâmica da região, simbolizando a visão ampla e profunda que Jesus queria transmitir. Ao escolher esse cenário, Jesus não apenas se colocava em uma posição elevada para ser ouvido, mas também simbolizava que suas palavras vinham de um lugar de autoridade celestial. A natureza, com sua grandiosidade e beleza, servia como um lembrete da majestade de Deus e da pequenez humana, convidando os ouvintes a olharem para além de si mesmos.

A humildade, como máxima do exemplo do Mestre, fica estampada na ausência de palácios, púlpitos de ouro de templos suntuosos quando ensinava a boa nova.

Outro momento significativo ocorreu à beira do Mar da Galileia, onde Jesus pregou para uma multidão tão grande que precisou entrar em um barco para se distanciar da margem e ser ouvido (Marcos 4:1-2). O som das ondas, o vento suave e o horizonte infinito do mar criavam uma atmosfera propícia para refletir sobre a profundidade de suas parábolas, como a do semeador. A natureza, nesse contexto, não era apenas um cenário passivo, mas uma ferramenta pedagógica.

O mar, com seus mistérios e força, ilustrava a grandiosidade do reino de Deus, enquanto a semente lançada à terra falava de crescimento, paciência e perseverança. A brisa trazida pelo mar, seguramente, amenizava e sustentava uma psicosfera mais elevada, propiciando maior fluidez mental e receptividade às mensagens amorosas do Cristo.

Além disso, Jesus frequentemente se retirava para lugares naturais isolados, como o deserto e montanhas, para orar e se reconectar com o Pai (ex.: Lucas 5:16). Esses momentos a sós com a natureza mostram que ele valorizava a quietude e a beleza natural como meios de restauração espiritual. No contexto social conturbado daquela época, esses retiros eram essenciais para renovar suas forças e manter o foco em sua missão. Se até o Mestre precisava de uma pausa, que dizer de nós?

Estes exemplos de Jesus nos revelam uma profunda conexão entre a natureza e a espiritualidade. A natureza tem o poder de inspirar, curar e transformar. Ela nos conecta com o divino e nos lembra do nosso lugar no universo. Na trindade universal² – Deus, Espírito e Matéria –, os ambientes naturais nos elevam o espírito a vencer um pouco a matéria ascendendo a consciência para a unidade com Deus.

Hoje, mais do que nunca, precisamos nos reconectar com a natureza. Vivemos em um mundo cada vez mais urbanizado e tecnológico, onde a natureza é frequentemente vista como um recurso a ser explorado, em vez de um santuário a ser preservado. A velocidade da vida digital nos leva a um tempo mental acelerado e imediatista. Muitas vezes essa aceleração nos penaliza a organização física, com ansiedades, arritmias e insônias.

Neste sentido, a natureza tem muito a nos oferecer. Ela pode nos curar do estresse e da ansiedade, nos inspirar a criatividade e nos retornar ao tempo natural das coisas, pois é este nosso tempo biológico.

Estudos científicos¹ comprovam que passar tempo ao ar livre, cercado por árvores, rios e montanhas, reduz o estresse, melhora o humor e fortalece a saúde mental. A natureza nos convida a desacelerar, a contemplar e a reconhecer que fazemos parte de algo maior, ou que somos parte de um todo.

Como Jesus, precisamos encontrar maneiras de nos conectar com a natureza e de nos inspirar em sua beleza e sabedoria. Isso pode ser feito através de atividades simples, como caminhar em um parque, praticar jardinagem ou apenas sentar-se em uma praça arborizada.

Busque um parque perto de você, ligue para aquele amigo ou familiar que um dia lhe o convidou para visitar a “roça” dele.

No capítulo 41 da obra Os Mensageiros, de Chico Xavier, o espírito André Luiz nos apresenta as potencialidades dos ambientes do campo para o refazimento espiritual:

“Decorridos alguns minutos, atingíamos pequena propriedade rural, povoada de arvoredo acolhedor. Laranjeiras em flor perdiam-se de vista. Bananeiras estendiam-se em leque, enquanto o goiabal, de longe, semelhava-se a manchas fortes de verdura. A relva macia convidava ao descanso. E o vento calmo passava de leve, sussurrando alguma coisa através da folhagem.

Aniceto respirou a longos haustos, e falou:

 – Os desencarnados, embora não se fatiguem como as criaturas terrestres, não prescindem da pausa de repouso. Em geral, nossas operações, à noite, são ativas e laboriosas. Apenas um terço dos companheiros espirituais, em serviço na crosta, conserva-se em atividade diurna.

E, notando-nos a curiosidade justa, sentenciou:

– Aliás, isto é razoável. O dia terrestre pertence, com mais propriedade, ao serviço do espírito encarnado. O homem deve aprender a agir, testemunhando compreensão das leis divinas. Pelo menos durante certo número de horas, deve estar mais só com as experiências que lhe dizem respeito.

Nosso instrutor amigo sorriu e observou:

 – O dia e a noite constituem, para o homem, uma folha do livro da vida. A maior parte das vezes, a criatura escreve sozinha a página diária, com a tinta dos sentimentos que lhe são próprios, nas palavras, pensamentos, intenções e atos, e no verso, isto é, na reflexão noturna, ajudamo-la a retificar as lições e acertar as experiências, quando o Senhor no-lo permite.

Calando-se o nosso orientador, tivemos a atenção exclusivamente voltada para a beleza circundante. Aquele campo amigo e hospitaleiro caracterizava-se por ambiente muito diverso. Não mais as emanações pesadas da cidade grande, mas o vento leve, embalsamado de suavíssimos perfumes. Refletia eu na bondade do Senhor, que nos oferecia recursos novos, quando Aniceto voltou a dizer:

 – A Natureza nunca é a mesma em toda parte. Não há duas porções de terra com climas absolutamente iguais. Cada colina, cada vale, possui expressões climatéricas diferentes. É forçoso reconhecer, porém, que o campo, em qualquer condição, no círculo dos encarnados, é o reservatório mais abundante e vigoroso de princípios vitais. Em geral, todos nós, os cooperadores espirituais, estimamos o ar da manhã, quando a atmosfera permanece igualmente em repouso, isenta dos glóbulos de poeira convertidos em microscópicos balões de bacilos e de outras expressões inferiores. Entretanto, os trabalhos de hoje não nos permitiram o descanso mais cedo…

Apoiamo-nos no veludoso relvado e, percebendo-nos a sede de saber, Aniceto prosseguiu:

 – Assim me explico, porque na floresta temos uma densidade forte, pela pobreza das emanações, em vista da impermeabilidade ao vento. Aí, o ar costuma converter-se em elemento asfixiante, pelo excesso de emissões dos reinos inferiores da natureza. Na cidade, a atmosfera é compacta e o ar também sufoca, pela densidade mental das mais baixas aglomerações humanas. No campo, desse modo, temos o centro ideal…

Indicando, prazeroso, as frondes balouçantes, acentuou:

– Reina aqui a paz relativa e equilibrada da natureza terrestre. Nem a selvageria da mata virgem, nem a sufocação dos fluidos humanos. O campo é nosso generoso caminho central, a harmonia possível, o repouso desejável.”

Quando nos conectamos com a natureza, estamos nos conectando com o Criador. A criatura que, por sua inteligência e diligência consegue construir para si os mais intrincados ambientes artificiais, precisa parar, retomar as bases com a criação. Essas pausas e reflexões frequentes, nos farão, na senda da evolução, integrar cada vez mais os nossos ambientes urbanos, as nossas casas, com os elementos naturais. Então,# -# mais árvores! Mais parques, mais quintais, mais pé no chão e brisa no rosto!

Querido irmão e querida irmã que chegaram até aqui, que possamos seguir o exemplo de Jesus e buscar na natureza não apenas um refúgio, mas um lugar de encontro com o divino e com a nossa essência. Que os montes, os mares e os campos nos inspirem a ouvir a voz de Deus e a reconhecer sua bondade e providência em cada folha que balança e cai ao vento. Afinal, a natureza é um santuário onde a alma encontra paz e a vida encontra sentido.

 

  • Nature and Mental Health: An ecosystem service perspective (2019) – https://advances.sciencemag.org/content/5/7/eaax0903

2 – Pergunta 27 de O Livro dos Espíritos.

 

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