A doutrina espírita é muito rica e tivemos muitas pessoas importantes e de destaque que ajudaram a construir a nossa história. Ela não foi criada ou fundada por um líder, mas sim o resultado do trabalho de diversos espíritos encarnados e desencarnados, cada um contribuindo de uma forma e construindo ao longo de vários anos nossa querida doutrina espírita.

Podemos citar como os nomes mais conhecidos o próprio Allan Kardec, Amélie Gabrielle Boudet, Leon Dennis, Camille Flamarion, as Irmãs Fox, dentre muitos outros. Porém frisamos que, apesar de famosos, à exceção de Allan Kardec, eles não são muito estudados. E nesse artigo vamos conhecer um pouco mais da história das irmãs Fox.

Inicialmente é importante ressaltar que, apesar de as Irmãs Fox serem consideradas as fundadoras do moderno movimento espiritualista, elas não foram espíritas[1] e não estavam dentre os médiuns que auxiliaram Kardec na codificação do Espiritismo.

Além disso temos o surgimento da doutrina espírita em 1857 com o lançamento de O Livro dos Espíritos, e os acontecimentos em Hydesville aconteceram 1848, quase uma década antes, porém foi a partir daí que as conversas com os espíritos se tornaram populares nos EUA e posteriormente na Europa, chegando até Hippolyte Léon Denizard Rivail, o codificador do Espiritismo.

Geralmente quando são citadas as Irmãs Fox, são relatadas apenas como as precursoras do Espiritismo, mas a trajetória delas foi bem conturbada e perigosa. Neste artigo veremos alguns pontos importantes na vida delas, um pouco de sua história, problemas e o que aconteceu depois dos acontecimentos.

A família Fox era composta pelo Sr. John Fox, sua esposa Sra. Margaret Fox, e das filhas Margareth (14 anos) e Katharine (11 anos). O Sr. e Sra. Fox já eram idosos, e a família era muito reclusa, em especial as filhas que quase não saíam da casa. Eles eram protestantes (metodistas) e em 1847 se mudaram para o condado de Rochester, em Hydesville, localizado no estado de Nova York.

Além de Margareth e Katharine, o casal tinha outros filhos já casados e que não moravam com eles. O Sr. John Fox era alcoólatra e abandonou a Sra. Fox em 1820, mas reataram o casamento em 1830, após a conversão dele à Igreja Metodista e sua recuperação do alcoolismo.

A casa onde foram morar já tinha fama de ser mal assombrada, mas como eram uma família pobre, era a que poderiam alugar. Já desde as primeiras noites eram ouvidos barulhos e arranhados nas paredes, porém os ruídos aumentaram no ano seguinte.

Em 31 de março de 1848 aconteceu a primeira comunicação com o espírito Rosma, porém nas semanas seguintes a família foi muito hostilizada e humilhada, pois a população local acusava as jovens Maggie e Kate de terem inventado essa comunicação.

Com o aumento da hostilidade, foi instaurada uma comissão para provar que elas estavam inventando tudo. Sem sucesso, instauraram outra comissão, composta exclusivamente por mulheres, onde realizaram diversos testes com as meninas nuas e amarradas, e novamente não puderam comprovar que era uma fraude.

Com a população cada vez mais exaltada e insatisfeita com as comissões anteriores, foi criada uma nova comissão feminina composto exclusivamente por mulheres céticas e contrárias as comunicações, mais uma vez sem sucesso.

Com o resultado dessa terceira, comissão a população se revoltou e tentou linchar as meninas por fraude, o que não ocorreu graças à intervenção de uma autoridade local. Como a população não aceitava essa situação, as autoridades sugeriram que elas se mudassem, pois não era possível garantir a segurança delas.

Com isso Kate foi morar com Leah, e Maggie com David Fox. Posteriormente Kate também foi morar Leah. Os sons acompanhavam Kate e Maggie, onde elas estivessem. Percebendo isso, Leah viu na mediunidade das irmãs mais novas uma oportunidade financeira.

Não vamos entrar aqui no mérito de cobrar pelas sessões mediúnicas, porém é evidente que Leah aproveitou para ganhar dinheiro com as comunicações espirituais, organizando uma estrutura para divulgar as comunicações espirituais, levando Maggie e Kate do anonimato ao estrelato nacional.

A rotina incluía: apresentações públicas e privadas, análises científicas ( Kate e Maggie serviram de cobaias pagas para cientistas), consultas espirituais, entrevistas, viagens, etc., muitas vezes extrapolando 12 horas por dia nessa rotina exaustiva. Todos queriam estar com elas: cientistas, políticos, autoridades, personalidades, pessoas comuns, ricos, enfim elas eram estrelas nacionais.

Os primeiros 20 anos foram de muito trabalho exaustivo, porém após esse período começaram os problemas.

Essa rotina acabou levando Kate e Maggie ao alcoolismo e possivelmente a problemas psiquiátricos[2]. Uma observação importante aqui, é que o álcool naquela época era tido como tonificador, um estimulante, por isso, quando elas estavam cansadas após as longas horas de trabalho, ofereciam bebidas alcoólicas para “ganharem forças” e continuarem o trabalho.

O alcoolismo criou problemas mesmo entre Kate e Leah, onde travaram uma disputa judicial pela guarda dos filhos de Kate. Leah denunciou Kate as autoridades, que acabou sendo presa por um breve período.

Com isso Kate se juntou a Maggie, e, para prejudicar a imagem de Leah, elas declararam que o Espiritismo era uma fraude, tudo orquestrado por Leah. Além disso, também existem indícios que elas receberam uma boa quantia em dinheiro de opositores do Espiritismo. Nessa época, elas já apresentavam dificuldades financeiras, agravada pelo alcoolismo.

Porém a declaração não teve muito impacto em Leah, e após aproximadamente um ano, Maggie e Kate voltaram atrás nas alegações. Nessa época os preceitos espíritas da mediunidade gratuita já estavam se fortalecendo, somados aos problemas pessoais e alegações de fraudes nas comunicações mediúnicas, elas ficaram desacreditadas, tanto junto aos espíritas daquele período quanto para os opositores.

Os últimos anos delas foram de muito sofrimento. Elas tentaram retornar às apresentações mediúnicas, mas sem sucesso. Alcoólatras, pobres, com problemas psiquiátricos, e evitadas pelos apoiadores de outrora, viveram da caridade de terceiros até o desencarne.

Leah Fox era aproximadamente 20 anos mais velha que Maggie, casou-se três vezes adotando os nomes: Fish, Brown e Underhill. Atuava com líder, inclusive gerenciando as sessões espíritas. Participou ativamente das formas iniciais e arranjos de comunicação com os espíritos desencarnados, inclusive as mesas girantes.

Kate foi patrocinada por um banqueiro americano para divulgar as comunicações mediúnicas. Pagava todas as despesas, inclusive sua viagem para a Europa. Em Londres ela casou-se com Henry Diedrich Jencken, advogado londrino com quem teve duas filhas. Após o desencarne do esposo, Kate voltou para o EUA e foi morar com Maggie.

Maggie casou-se com o puritano Elisha Kane, que considerava as comunicações uma fraude, e que Leah as enganava e as usava exclusivamente para ganhar dinheiro. Kane conseguiu plantar a dúvida em Maggie, e após o falecimento do esposo em 1858, ela converteu-se ao catolicismo.

Maggie e Kate tiveram papel fundamental como médiuns e Leah também teve participação de destaque, sendo a grande responsável pela promoção, divulgação e popularização das comunicações mediúnicas pelos EUA. Desde a adolescência elas passaram por inúmeras provações, e mesmo com o estrelato, a vida delas não foi fácil, e infelizmente sucumbiram em muitas provações. Lembramos ainda que as bases do uso adequado da mediunidade vieram somente com Allan Kardec.

Como dito anteriormente, as Irmãs Fox não estavam dentre os médiuns que auxiliaram Kardec na codificação do Espiritismo, e que justamente pelas falhas de todos nós, Kardec buscou informações de inúmeros médiuns em seu hercúleo trabalho, pelo método denominado Controle Universal do Ensino dos Espíritos[3].

Alguns estudiosos espíritas entendem que a história complicada das Irmãs Fox desestimula um estudo aprofundado sobre elas na maioria dos centros espíritas, porém é importante conhecermos melhor a vida conturbada delas, e não podemos deixar de reconhecer a sua importância omo precursoras da doutrina espírita, e reforçamos que não é necessário sermos perfeitos para mudarmos o mundo.

 

NOTA DA REVISTA – A COMPROVAÇÃO DO FENÔMENO DE 1848

A despeito da confusa credibilidade de muitas das informações trazidas pelas Irmãs Fox, uma descoberta em 1904 veio a comprovar o que foi dito pelo espírito em 1848, quando das primeiras comunicações.

Na ocasião, foram encontrados apenas vestígios do antigo corpo material do espírito, que se identificou como caixeiro viajante, assassinado naquela casa e enterrado no porão. Contudo, em 22 de novembro de 1904, localizou-se “entre a terra e os escombros das paredes do porão, um esqueleto humano quase completo” e “uma caixa de mascate”. Restou evidenciado que o criminoso enterrou o corpo no porão, mas o transferiu a um local de difícil acesso, buscando ocultar o delito. Assim, já com os protagonistas do drama desencarnados, fechou-se o último elo.

Essa parte da história pode ser vista com os devidos detalhes na obra A história do Espiritualismo, de Arhur Conan Doyle, capítulo 4 – O Episódio de Hydesville

 

Referências:

  1. Palhano Jr. , Lamartine, Rosma, o Fantasma de Hydesville.
  2. Wantuil, Zêus, As Mesas Girantes e o Espiritismo, Editora FEB.
  3. Observador Crítico das Religiões – https://observadorcriticodasreligioes.wordpress.com/2017/11/02/as-irmas-fox-falando-com-os-mortos-ou-enganando-os-vivos/

Federação Espírita Brasileira – http://www.febnet.org.br

  1. Wikipedia – http://www.febnet.org.br

[1] Nota da Revista: Espiritismo é uma doutrina enviada pelos espíritos e codificada (organizada) por Allan Kardec, que a batizou, logo na introdução de O Livro dos Espíritos: “…Diremos, pois, que a doutrina espírita ou o Espiritismo tem por princípio as relações do mundo material com os espíritos ou seres do mundo invisível. Os adeptos do Espiritismo serão os espíritas, ou, se quiserem, os espiritistas….”

[2] Nota da Revista – embora não tenhamos como avaliar o caso das Irmãs Fox, suscitamos duas hipóteses bastante comuns: (i) problemas mediúnicos são comumente confundidos com distúrbios psiquiátricos; e (ii) o mau uso da mediunidade pode efetivamente acarretar lesões no cérebro e consequentes problemas psiquiátricos.

[3] Nota da Revista: Na obra O Evangelho Segundo o Espiritismo, Introdução, item II, Kardec explica o método do Controle Universal do Ensino dos Espíritos.

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