Maria de Nazaré, por Suséli Verdéli

Foi com imensa alegria que recebi o convite para escrever sobre Maria de Nazaré, não só porque Maria é uma figura de grande estima na era cristã sendo mãe de Jesus, mas também porque sempre que penso nela, minha infância me vem à lembrança e me recordo das canções que aprendi e cantava em louvor à Mãezinha do Céu.

Quando criança, ela era, para mim, o maior exemplo de amor que já ouvira falar e, como nas músicas, eu a imaginava uma mulher doce, simples, com manto azul, véu branco e que havia sofrido e chorado muito pelo seu filho. Com a maturidade e a maternidade passei a ver Maria como um Espírito de tamanha envergadura que, de fato, somente ela poderia ser capaz de encarnar com mãe de Jesus. 

Falar de Maria é uma tarefa que exige delicadeza e respeito. São poucos os registros bíblicos ao seu respeito, como referências bíblicas encontramos as passagens a seguir: Lc 1:26-39, descrevendo o momento em que Maria é escolhida por Deus; LC 1:39-45, a visita de Maria a Isabel; LC 2:1-6, a viagem de José e Maria, grávida, da Galileia para Belém por ocasião do censo; Lc 2:7-40, nascimento de Jesus, a chegada dos Magos e a visita ao templo; Lc 2: 41-52, o diálogo de Jesus com os doutores; Mt 12:46-50 e Jo 2:1-5, durante o ministério de Jesus, Jo; 19:25-27, Jesus no Calvário; e At 1:14, Maria junto aos discípulos.

Como podemos notar, o Evangelho segundo Lucas é a principal fonte bíblica sobre Maria, isto porque, segundo Emmanuel, no livro Paulo e Estêvão, no período de dois anos em que Paulo de Tarso esteve preso em Cesareia, ele relatou a Lucas o desejo de escrever uma biografia de Jesus, valendo-se das recordações e informações de Maria. Paulo a descreveu como sendo uma criatura simples e amorosa que mais se assemelhava a um anjo vestido de mulher. Já que Paulo não poderia ir a Éfeso, pediu ao médico amigo que assim o fizesse, julgando serem, tais informações, dados indispensáveis e de grande importância para os adeptos do Cristianismo. 

Além destas referências citadas no Novo Testamento, encontramos na literatura espírita obras que nos ajudam a reconhecer a grandeza desse espírito evoluído que já havia conquistado, há mais de 2000 anos, elevadas virtudes, tornando-se apta a executar a importante missão de ser mãe de Jesus, que, como sabemos, é nosso maior modelo de perfeição moral a ser seguido. Outros importantes dados biográficos de Maria revelam que ela continua até hoje zelando com muito carinho pela Humanidade terrestre, encarnada e desencarnada. 

Para que Jesus encarnasse na Terra, esclarece-nos Emmanuel que foi necessária uma intensa preparação espiritual. O plano maior traçou seus objetivos e os colocou em prática, iniciando-se então a escolha daqueles que auxiliariam Jesus. Todos esses colaboradores prontificaram-se a exercer a sua missão, cada qual conforme as determinações do alto e do planejamento realizado. Vários profetas vieram à Terra anunciando a vinda do Messias, conduzindo todos os elementos para a salvação dos povos. O caminho precisava ser preparado para o maior de todos os profetas, o governador do nosso planeta. A encarnação de Simeão, Ana, Isabel, João Batista, José e Maria, teve importância decisiva, verdadeiros mensageiros da Boa Nova, portadores da contribuição de fervor, crença e vida, sem eles, o Cristo não encontraria elementos necessários para fazer cumprir sua tarefa. 

A vinda de Jesus se deu em um momento em que o mundo era um imenso rebanho desgarrado, com ideias religiosas politeístas e a humanidade se mostrava necessitada e em condições de receber novos ensinamentos.  

Seus pais, Maria e José, foram os eleitos do Senhor; seus espíritos experientes entraram em contato com a humanidade conservando consciência de sua tarefa e coube a Maria de Nazaré, a missão sublime de ser a mãe de Jesus, aquela que o ensinaria a caminhar, falar, a que iria conduzir os passos do Messias até que ele pudesse, pessoalmente, conduzir toda a humanidade. Portanto, a missão de Maria começa no plano espiritual quando aceita fazer parte desse grupo de espíritos abnegados de Jesus, sendo instrumento divino. 

Segundo informações das fontes cristãs antigas, Maria (ou Miriam) cujo o nome de origem hebraica significa Senhora da Luz, era filha de pais judeus, Joaquim e Ana. Há dúvidas quanto ao local exato do seu nascimento ocorrido entre 18 ou 20 a.C., em Jerusalém ou em Séforis, na Galileia. Durante a sua infância viveu em Nazaré, onde ficou noiva do carpinteiro José, da tribo de Davi. Possivelmente, ela casou aos 14 anos, como era comum à época.

Encontramos nos Evangelhos que ela teve a visão de um anjo dizendo-lhe que seria mãe de uma criança divina, e assim atendeu humildemente às determinações do mais alto. Na obra Religião dos Espíritos, Emmanuel nos lembra que o Supremo Poder do Universo foi recorrer a uma mulher, num lar apagado e simples, que sendo humilde, ocultava a experiência dos sábios, era frágil como o lírio mas trazia consigo a resistência do diamante e a virtude como tesouro incorruptível do coração e a ela foi dada a tutela da vida preciosa do Embaixador Divino.

Neste instante, mergulhemos na vida de Maria de Nazaré, façamos uma viagem aos tempos antigos e vamos imaginar a jovem Maria, em Nazaré, envolvida nos cuidados com o lar, terminando seus afazeres, prestes a se recolher ao seu leito, para o necessário repouso e, com o pensamento em estado de oração, elevando a Deus suas preces de agradecimento pela vida e em total ligação espiritual, percebe a presença de uma luz intensa à sua frente, em figura humana, um Espírito angélico que vinha trazer-lhe a notícia do nascimento do Messias, anunciando-lhe que ela tinha sido escolhida para recebê-lo em seu ventre. A saudação que recebera “cheia de graça” já demonstrava que ela, Maria, teria as condições para, no decorrer de sua vida, demonstrar toda a sua fortaleza moral e fé inabalável nos desígnios supremos; compreendera que sua vida seria marcada pela renúncia e pela prática do amor incondicional e extravasando sua fidelidade a Deus, exclama “Eu sou a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lucas 1:38). 

E Jesus foi acolhido em um lar, cuidadosamente velado por essa mulher extraordinária. Advertida por Simeão, sacerdote no templo de Jerusalém, quando fora levar Jesus para a apresentação e purificação conforme as determinações da Lei de Moisés, tinha a intuição vívida do que haveria de cumprir, acompanhando o caminhar de seu filho querido, que desde menino mostrava consciência e clareza de sua missão terrena.

Imaginemos agora a aflição dessa mãe ao procurar seu filho e não o encontrar, e após três dias achá-lo no templo, sentado entre os doutores, ouvindo-os e interrogando-os deixando a todos surpreendidos com sua sabedoria e suas respostas e ao questioná-lo escuta que ele discutia as coisas de seu Pai com aqueles que diziam representá-lo diante do mundo.

Quando Jesus iniciou seu ministério, certamente como qualquer mãe, ficava feliz quando ele retornava a Nazaré, depois de suas caminhadas pelas redondezas e cidades mais distantes, embora a consciência lhe advertisse que aquele homem, nada comum, trazia uma palavra que gerava raiva, inveja e medo àqueles que detinham o poder e que dominavam o cenário político e social e que isso lhe renderia sérias consequências.

E vemos essa mãe, acompanhando Jesus, nos derradeiros momentos do calvário; Humberto de Campos no livro Boa Nova, no capítulo dedicado a ela, lembra-nos que diante da cruz, ela deixava-se guiar pelas lembranças do nascimento de Jesus na manjedoura, da amizade e das conversas com Izabel, das profecias do velho Simeão, de Jesus menino em conversação caridosa com os viajantes, lavadeiras, mendigos sofredores e até malfeitores, tratando a todos como irmãos. Nas menores coisas, reconhecia a intervenção da Providência celestial e mesmo que dos seus olhos vertessem lágrimas molhando sua face, sentindo seu coração arrebentado de tristeza, no seu íntimo, no santuário da sua consciência ecoavam aquelas palavras ditas anos atrás, eu sou a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra; palavras essas que se repetiam e se afirmavam a cada instante.

Resignada, diante do maior testemunho da sua missão, Maria sente uma mão amiga tocar o seu ombro. Era o apóstolo João a lhe estender os braços amorosos. Todos os que integravam o reduzido colégio do Senhor, haviam debandado receosos da perseguição, mas João estava lá ao seu lado. Cristo, no instante derradeiro vendo a cena, dirigindo-se de modo especial, com um leve aceno, ao apóstolo disse: — “Filho, eis aí tua mãe, palavras que ensinavam sobre o amor universal.

E assim Maria esteve com Jesus até o fim. 

Após a separação dos discípulos, que se dispersaram por lugares diferentes, para a difusão da Boa Nova, Maria retirou-se para a Betaneia, onde alguns parentes mais próximos a esperavam com especial carinho. Tempos depois, João, recordando-se das observações feitas pelo Mestre, vai ao encontro dela, e conta-lhe sobre sua nova vida entre almas devotadas e sinceras no exercício dos ensinamentos cristãos. Num misto de reconhecimento e ventura, Maria se instala junto ao dedicado apóstolo, em Éfeso, numa casinha simples e pobre, no alto de uma pequena colina de onde se avistava o mar; lá cultivavam a lembrança permanente de Jesus, estabeleceram um pouso e refúgio aos desamparados, ensinavam as verdades do Evangelho a todos os espíritos de boa-vontade e, como mãe e filho, iniciaram uma nova era de amor na comunidade universal.

Como a igreja de Éfeso exigia de João a mais alta expressão de sacrifício pessoal, quase sempre Maria estava só, e em sua choupana, então, conhecida pelo nome de “Casa da Santíssima”, diariamente, acudia os desamparados, suplicando a assistência espiritual. Eram velhos trôpegos e desenganados do mundo, que lhe vinham ouvir as palavras confortadoras e afetuosas, enfermos que invocavam a sua proteção, mães infortunadas que pediam a bênção de seu carinho.

Os anos passaram sem que ela deixasse, um dia, de amparar e transmitir ao coração do povo as mensagens da Boa Nova.

Em uma noite enquanto Maria observava o luar, viu se aproximar um pedinte que, chamando-a de mãe, assim como tantos faziam, se ofereceu para lhe fazer companhia e buscar benções. Maternalmente o convidou a entrar e passaram a conversar, sua voz lhe inspirava profunda simpatia. O peregrino lhe falou do céu, confortando-a delicadamente. Pensava: que mendigo seria aquele que lhe acalmava as dores secretas da alma saudosa com tanta doçura? Foi quando o hospede lhe estendeu as mãos e falou amorosamente — “Minha mãe, vem aos meus braços!” Nesse instante, fitou as mãos nobres que se ofereciam, num gesto da mais bela ternura. Tomada de comoção profunda, viu nelas duas chagas, como as que seu filho revelava na cruz, e instintivamente, dirigindo o olhar ansioso para os pés do peregrino amigo, divisou também aí as úlceras causadas pelos cravos do suplício. De ímpeto quis se ajoelhar, mas Jesus, levantando-a, ajoelhou-se aos seus pés e beijou suas mãos. Este encontro lhe trouxe tamanha alegria.

No dia seguinte, a devotada mãe santíssima, aguardava serenamente a ruptura dos derradeiros laços que a prendiam à vida material. Experimentava a sensação de se estar afastando do mundo, quando entidades angélicas a cercavam cantando hinos de glorificação; Maria se lembrou dos discípulos perseguidos pela crueldade do mundo e desejou abraçar os que ficariam no vale das sombras, assim seu desejo a conduziu até uma multidão guardada a ferros em escuros calabouços romanos. Penetrando nos sombrios cárceres, Maria se aproximou de um a um, sentindo as suas angústias, fez suas preces, espalhou sua misericórdia e, antes de partir, aproximou-se de uma jovem encarcerada, lhe disse ao ouvido para cantar, canção essa que foi acompanhada pelas centenas de vozes dos que choravam no cárcere, aguardando o glorioso testemunho. 

 Como todo Espírito Superior, a missão de Maria não terminou com seu desencarne, pelo contrário, o trabalho da Mãe Santíssima, como ficou conhecida para sempre, intensificou-se. No livro Memórias de um Suicida, segundo Camilo Castelo Branco, vamos encontrá-la no comando da Legião dos Servos de Maria que reúne Espíritos devotados à assistência dos suicidas, resgatando-os das zonas inferiores e encaminhando-os ao Hospital Maria de Nazaré, instituição dirigida pela mãe de Jesus. 

Em diversas obras, os Espíritos superiores fazem referência à dedicação de Maria aos sofredores. No livro Ação e Reação, André Luiz relata que as preces dirigidas a ela são acolhidas pelos seus emissários, afim de serem examinadas e atendidas.

Neste instante, façamos a reflexão pensando em nós mesmos, na nossa família e naqueles que nos foram confiados. Na condição de pais, buscamos constantemente o melhor para nossos filhos, preocupamo-nos com seu bem-estar, sofremos diante de suas dores, ficamos apreensivos com suas escolhas e também nos alegramos com suas conquistas. Isto é natural para a maioria dos pais e mães encarnados, no entanto, é preciso compreender que cada Espírito tem sua trajetória e necessidades individuais, por mais que tentemos nem sempre conseguimos afastar ou eliminar os obstáculos que nossos filhos terão que trilhar por eles mesmos. 

Na condição evolutiva em que nos encontramos e levando em consideração a nossa pequenez, muitas vezes é difícil compreender, em sua amplitude, a missão de Maria, imaginemos como ela se sentiu ao perceber que seu filho muito amado, sendo rejeitado e mortificado pela ignorância humana, nada pôde fazer para impedir o sofrimento daquele que encantava a todos com seus ensinamentos, palavras e exemplos que refletiam somente o amor.

Quem de nós sobreviveria a tamanho sofrimento? Quem de nós aceita com resignação fatos dolorosos e tristes? Quem de nós não se deixa levar pela revolta? Temos muito o que aprender com Maria.

No Livro, Mulheres do Evangelho, Estevão nos fala de uma mulher que deixou sua marca, indelével, nas vidas das mulheres de todas as origens, de todos os povos. Em sua pessoa, a mulher alcançou as estrelas e, através de sua santíssima maternidade, divinizou a expressão de mãe. E termina dizendo… É Maria. Simplesmente, Maria.

Diante de tudo que lemos e aprendemos ao seu respeito, fica claro que ela foi, e é, um grande exemplo a ser seguido. Seu exemplo de fé deve inspirar a todos no enfrentamento das dificuldades da vida e dos obstáculos que surgem em nosso caminho. Dessa forma, podemos pedir seu auxílio diante de situações aflitivas, recorrendo ao seu amor maternal, amor esse que nos acolhe como seus filhos queridos, rogando força, coragem, fé e sabedoria, recordando que, assim como Maria, diante de seus fundados receios, não impediu a caminhada do seu Filho, cabe a nós seguirmos firmes os ensinamentos recebidos por Jesus esforçando para a nossa reforma íntima, tendo a consciência de que somos responsáveis pelas nossas escolhas e fazendo a nossa parte frente as oportunidades de aprendizado.

E para terminar, gostaria de lembrar que ela, ainda encarnada, acalmava as dores dos sofredores dizendo carinhosamente: Isso também passa!

Sugestões para aprofundamento:
  • Paulo e Estevão. Psicografia de Francisco Cândido Xavier, pelo Emmanuel, Cap. VII – As Epístolas e Cap. 8 – Martírio em Jerusalém.
  • A Caminho da Luz. Psicografia de Francisco Cândido Xavier, pelo Espírito Emmanuel, Cap. XII – A Vinda De Jesus.
  • Estudo aprofundado da Doutrina Espírita. Livro I, Cristianismo e Espiritismo, Modulo II. Organizado por Marta Antunes de Oliveira de Moura – FEB
  • Pão Nosso. Psicografia de Francisco Candido Xavier, pelo Espírito Emmanuel, Cap. CXXI – Monturo.
  • Religião dos Espíritos. Psicografia de Francisco Cândido Xavier, pelo Espírito Emmanuel, Cap. LII – A mulher ante o Cristo 
  • Maria Mãe de Jesus. Francisco Candido Xavier e Yvonne A. Pereira, organizado por Edson Carneiro.
  • Boa Nova. Psicografia de Francisco Cândido Xavier, pelo Espírito Humberto de Campos, Cap. II – Jesus e o Precursor e Cap. XXX – Maria.
  • Memórias de um suicida. Psicografia de Yvonne A. Pereira, pelo espírito Camilo Candido Botelho – Cap. I, Legião dos Servos de Maria.
  • Ação e Reação. Psicografia de Francisco Cândido Xavier, pelo Espírito André Luiz, Cap. XI – O templo e o parlatório.
  • Mulheres do Evangelho. Psicografia de Robson Pinheiro, pelo espírito Estêvão, Cap. 9 – Maria de Nazaré.

 

 

 

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