Márcia Léon, médica gastropediatra, vice-presidente da Associação Médico Espírita do Planalto

 

 

Todos os dias a experiência nos traz a confirmação de que as dificuldades e os desenganos com que muitos topam na prática do Espiritismo se originam da ignorância dos princípios desta ciência e feliz nos sentimos de haver podido comprovar que o nosso trabalho, feito com o objetivo de precaver os adeptos contra os escolhos de um noviciado, produziu frutos e que à leitura desta obra devem muitos o terem logrado evitá-los.”¹ Com estas palavras, inicia o Codificador, Allan Kardec, o Livro dos Médiuns, o guia dos médiuns e dos evocadores, no posicionamento de identificar a finalidade e o objetivo maior desta obra que é o estudo da mediunidade.

 

Um pouco mais adiante, o professor Rivail vem nos afirmar que os Espíritos não são senão as almas dos homens despojadas do invólucro corpóreo² e que mantêm a sua consciência preservada após a desencarnação e através das comunicações entre os dois planos da vida, podemos identificar o seu pensamento, a sua afetividade e as suas relações para conosco.

 

É através da mediunidade que estabelecemos estes laços, entre os mundos visível e invisível, pois se trata de uma faculdade orgânica delimitada ao corpo físico, porém utilizando toda a área sensorial do perispírito através do campo mental do espírito. O Codificador também afirma que todos somos médiuns, nos mais variados graus, desde a intuição até a ostensividade e que porquanto há médiuns de todas as idades, de ambos os sexos e em todos os graus de desenvolvimento intelectual

 

Esta fala do Codificador vem ao encontro do que André Luiz, no livro Missionários da Luz, nos capítulos relativos à preparação da reencarnação do espírito Segismundo, nos esclarece que muitos espíritos, aos reencarnarem, já trazem a pré disponibilidade da elaboração da eclosão da mediunidade em algum momento da sua vida e a partir daí a expansão natural desta faculdade.

 

A partir desta fala do Codificador, no que tange a vida infantil, sabemos que a criança é um ser espiritual em uma vivência encarnatória, traz uma bagagem cognitiva, psíquica e emocional próprias, coletadas e vivenciadas em experiências encarnatórias anteriores e que apresenta grandes potencialidades de desenvolvimento moral.

 

Sabemos que a literatura espírita nos traz inúmeros nomes de crianças vinculadas à eclosão da mediunidade em tenra infância, como Francisco Cândido Xavier, Divaldo Pereira Franco, Yvonne do Amaral Pereira, Ermance Dufaux, as irmãs Kate e Margareth Fox, Florence Cook, Joana d’Arc, dentre outras.

 

Os vários exemplos acima puderam defrontar o mundo espiritual nas suas mais variadas formas como pela clarividência, clariaudiência tanto quanto pelo diálogo direto com os espíritos.

 

Allan Kardec já nos esclarecia no item 221 do capitulo XVIII do Livro dos Médiuns, no tocante aos perigos e inconvenientes da mediunidade, que “quando numa criança a faculdade se mostra espontânea, é que está na sua natureza e que a sua constituição se presta a isso(…). Nota que a criança que tem visões geralmente não se impressiona com estas, que lhe parecem naturalíssimas, a que dá muito pouca atenção e quase sempre esquece. Mais tarde, o fato lhe volta à memória e ela o explica facilmente, se conhece o Espiritismo.”(4)

Essa naturalidade da percepção do mundo espiritual é extremamente comum para muitas crianças, quando elas podem divisar familiares próximos, já desencarnados, e travar com eles diálogos a cerca da rotina do dia-a-dia, ou brincar com o seu amigo, dito “amigo invisível”, como se ele ali estivesse materializado e nós o pudéssemos divisar. É bem natural que os pais destas crianças possam assombrar-se com o fato, em especial quando não conhecedores da fenomenologia espiritista, tendo em seu modo de pensar que a criança possa estar inventando a situação, mas é do nosso conhecimento que se trata de algo natural e passível da mais profunda credulidade e verdade. Até os sete anos, as crianças têm um intercâmbio natural com o mundo espiritual, podendo divisá-lo a qualquer hora e nas mais diversas situações.

Porém, nem apenas de amizade recíproca vive a mediunidade na infância. Por se tratar de uma faculdade do intercâmbio mediúnico, podemos também divisar os processos obsessivos, muito bem colocados por Allan Kardec em toda a sua obra e também por obras complementares robustas como o livro Mediunidade e Obsessão em crianças, de Suely Caldas Schubert.

Pelas leis da afinidade e sintonia, muitos dos obsessores se ligam aos seus antigos desafetos, comparsas de outros momentos do passado, mesmo na mais tenra idade do espírito reencarnado, trazendo muito desconforto, dor e sofrimento a este e à sua família. Mais uma vez, a percepção pelos pais de que o filho apresentou mudanças do comportamento, tais como, tornou-se irritadiço sem motivo aparente a ponto de desencadear sensações de fúria, apresentando terror noturno, medo incompreensível com sentimentos persecutórios, dificuldade para dormir, quadros depressivos, ideação suicida, automutilação, uso de drogas lícitas e ilícitas, dentre outros, realmente se torna um grande motivo para as mais variadas preocupações.

Neste instante, é necessário parar, observar, procurar ajuda especializada e também na casa espírita. Consideramos aqui a busca dos profissionais de saúde, pois é necessário investigar uma causa orgânica primeiramente. Muitos transtornos comportamentais e/ou doenças orgânicas podem apresentar estes mesmos sinais ou sintomas, confundindo-se muitas vezes, com problemas de natureza espiritual. Uma vez diagnosticados, é necessário tratar, seja médica ou psicoterapeuticamente.

Ao mesmo tempo, as benesses do amparo espiritual da criança, do jovem e da família na casa espírita são extremamente importantes, pois os esclarecimentos se fazem presentes, a assistência pelo passe, pela irradiação, pela palestra edificante e a instalação do estudo do Evangelho no lar, são terapias complementares de amparo e tratamento espiritual nos dois planos da vida.

Deixai vir a mim as criancinhas”, já nos conclamava Jesus em tempos imemoriais. O entendimento, o estudo dos fenômenos mediúnicos na infância, nos faculta a possibilidade de não patologizar os comportamentos infantis fora dos padrões normais sociais esperados, mas nos dá a chance de estabelecermos um vínculo para a evangelização dos espíritos encarnados e desencarnados dentro do Evangelho de Jesus e compreendermos que a eclosão da mediunidade na infância, faz parte de um processo normal e natural para a adequação moral do espírito em qualquer tempo.

 

Referências Bibliográficas:

  • Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, Introdução, Ed FEB
  • Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, Introdução, Ed FEB
  • Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Introdução, item IV, Ed FEB
  • Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, Perigos e Inconvenientes da Mediunidade, item 221, subitem 7, Ed FEB

 

 

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